Ex Machina
Autores: Brian K. Vaughan (roteiro) e Tony Harris (arte)
Editora: Panini
Formato americano (17 x 26 cm), miolo LWC
Edições:
Volume 1 – Estado de Emergência
Volume 2 – Símbolo
Volume 3 – Fato vs Ficção
Volume 4 – Marcha à Guerra
Volume 5 – Fumaça e Fogo
Volume 6 – Blecaute
Volume 7 – Ex Cathedra
Volume 8 – Truques Sujos
Volume 9 – Os Sinos da Despedida
Volume 10 – Limite de Mandato
Ex Machina é uma série em 50 capítulos e 4 edições especiais criada por Brian K. Vaughan e Tony Harris. Vencedora do prêmio Eisner de Melhor Série Nova em 2005, ela foi publicada aqui no Brasil em 10 edições encadernadas, com o último tendo sido lançado bem recentemente pela Panini.
A história se passa em uma Nova York bem parecida com a cidade do nosso mundo, mas com algumas diferenças que são cruciais para a série. Uma delas é a existência de Mitchell Hundred, um engenheiro civil que no ano de 1999 ganhou, misteriosamente, poderes que lhe permitiam falar com as máquinas, fossem elas mecânicas, elétricas ou eletrônicas, e decidiu tornar-se um super- herói (A Grande Máquina). Mas a série não é (só) sobre um cara com poderes a lá seriados de ficção científica. E aí é que entra uma segunda diferença importante entre a nossa Nova York e a de Ex Machina: Uma das torres gêmeas não foi atingida por um avião no 11/09. Avião este que foi impedido pela Grande Máquina, fato que elevou a popularidade de Mitch, até então um candidato independente e sem muita expressão, e fez com que o mesmo se tornasse o prefeito daquela que é, na opinião de muitos, a maior cidade do planeta.
E é aí que BKV (como Brian K. Vaugahn também é conhecido) começa a demostrar toda a criatividade já revelada antes na série Y: O último homem. A ideia de ter um ex-super-herói como prefeito de uma cidade pode não ser a coisa mais original do mundo, mas está longe de ser um cliché. E o autor lida muito bem com isso.
Ainda quando propôs a série para o selo Wildstorm da DC Comics, BKV já delineava que os arcos seguiriam uma estrutura padrão: Um tema político social relevante que Mitch teria que lidar como prefeito; flashbacks de seu passado como Grande Máquina e uma trama policial/ficção científica envolvendo o prefeito, a origem de seus poderes e alguns velhos “fantasmas” de seu passado. Com cada um desses elementos tendo maior ou menor destaque de acordo com o arco.
E Vaughan consegue utilizar cada um desses elementos de forma sensacional. Temas como: sistema educacional, casamento gay, maconha, guerra no Iraque, aborto e outros são tratados de forma séria e tão natural que, em alguns momentos, te fazem esquecer de que o prefeito da cidade pode literalmente falar com um aspirador de pó (e obter resposta).
Os personagens coadjuvantes também são muito bem construídos. Sejam os parceiros de Mitch do seu tempo como herói:
Mas a grande personagem da série, ao lado de Hundred, é sem dúvida a cidade de NY. BKV mostra ser um exímio conhecedor da cidade, apesar de não ter nascido lá, e sua admiração pela mesma fica evidente na edição 40 (primeira história do nono encadernado no Brasil), em um dos mais divertidos exercícios de meta-linguagem que eu já li. Ao longo desses 10 encadernados, além de uma aula de geografia nova iorquina, pode-se aprender muito sobre a história da cidade e também do funcionamento da política nos EUA e em especial de NY.
Quanto à personalidade de Mitchell Hundred, BKV o apresenta como um obcecado pelo trabalho, um homem extremamente determinado em fazer o que julga necessário pela cidade que ama. O fato de Mitch ser fã de quadrinhos é bastante explorado durante a série e em parte justifica a existência da Grande Máquina.
O outro lado mais ficção científica da história trata da origem dos poderes de Mitch e é o fio-condutor da série. Apesar de ir dando pistas pelo caminho, BKV só realmente revela a natureza dos poderes da Grande Máquina nos encadernados finais. Até porque o prefeito é proibido de comentar qualquer coisa sobre seus poderes devido a um acordo com a Agência Nacional de Segurança, quando decidiu concorrer nas eleições de 2001.
Apesar da série como um todo manter uma excelente qualidade existem alguns pontos fracos. No meio da série ela parece perder um pouco do fôlego inicial, especialmente os encadernados 7 e 8 (Ex-Cathedra e Truques Sujos), os mais fracos entre os 10. Inclusive em Ex-Cathedra BKV retira Mitch de seu “habitat natural” e o leva ao Vaticano (WTF?) e ainda que o roteiro justifique essa viagem, a história não está no mesmo nível das outras.
Porém, nos dois encadernados que fecham a trama (Os Sinos da Despedida e Limite de Mandato) a história chega ao seu clímax com o autor revelando toda a origem por trás dos poderes de Mitchell Hundred (e para aqueles que reclamarem da explicação lembrem-se sempre que desde seu início essa era uma série de ficção científica). Desde a primeira história sabemos que 2005, o último ano do mandato de Mitchelll Hundred, era considerado por ele como “maldito” mas só vemos o motivo nesse final. São muitas cenas impactantes, reviravoltas inesperadas e ação vertiginosa com alguns detalhes adicionais pra deixarem um gosto amargo em quem acompanhou a série toda. O autor mostra uma faceta de Mitch muito mais controversa do que a que era apresentada até então. Vemos um personagem humano e bem menos admirável do que gostaríamos ou do que fomos levados a pensar durante toda a série. Se o objetivo era surpreender BKV consegue 10 com louvor.
A mensagem final acaba sendo mais uma pergunta do que uma afirmação: Os fins justificam os meios? Pergunta essa resumida ou respondida em uma frase do próprio Mitchell Hundred durante o arco final: “Eu sou um político… Eu minto”.
Por fim, deixo meus parabéns a Panini por terem completado a publicação deste material no Brasil em um formato de boa qualidade e com preços bastante acessíveis. Além disso, aconselho a todos que já leram ou pretendem ler a série, que o façam “em uma tacada só”. Ler todos os 10 volumes minimiza os efeitos da “barriga” que a série tem em seu meio e ainda te mantém mais atento às pistas lançadas edição após edição deixando mais evidente a forma como BKV vai montando seu quebra-cabeças.
P.S.: Uma curiosidade sobre a publicação desta série no Brasil é que a Panini chegou a lançar o primeiro encadernado (Estado de Emergência) em 2005 e logo depois os direitos da mesma foram comprados pela Pixel, editora que lançou o segundo arco (Símbolo) em formato de mini-série e depois como “encalhernado”. Em 2009 a Panini voltou a publicar a série a partir do terceiro encadernado (Fato vs Ficção) e em 2011 republicou os dois anteriores.
Ótima análise!