Divã da Nikita #02 - A difícil arte de ser uma colecionadora de quadrinhos: Parte 1

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Há tempos eu buscava um assunto que fosse um pouco mais pessoal para tratar aqui na minha coluna. Pensei diversas vezes em falar sobre os tipos de quadrinhos que curto ou quadrinhos inusitados, hipóteses essas que não descarto, é claro, sendo que recentemente me veio à cabeça relatar algumas situações pela qual eu passo ou já passei por ser uma mulher leitora de HQs

Confesso que acho o tema um tanto quanto clichê, mas também é bem pessoal e merece certa atenção, pois apesar de hoje em dia o nerd estar em evidência e alguns serem até considerados descolados, as mulheres que curtem quadrinhos (que não são mangás) ainda são tratadas como aliens na Área 51.

Sendo assim, resolvi não mais torcer o nariz para o assunto e decidi relatar aqui no Divã da Nikita (porque nesse mundo de loucos, só eu tenho a mente sã) sobre as dificuldades de ser uma garota apreciadora de história em quadrinhos e nesse primeiro texto vou contar um pouco sobre como fui apresentada à nona arte e minha primeira decepção proveniente dos quadrinhos.

Tudo teve início em meados dos anos 90, quando um “peguete” da minha irmã mais velha levou a Wizard número 3 na minha casa. Já de cara me encantei com a arte da capa, e vocês podem ver o porquê logo abaixo:

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Sempre adorei desenhar pessoas, e essa era a época em que a Image estava começando a lançar aqui no Brasil quadrinhos do Spawn, Gen 13, WildC.A.T.S. e etc.. Como todo mundo bem sabe, a Image foi fundada por desenhistas da Marvel que queriam ter autonomia sobre suas criações, com isso resultou em histórias compostas de desenhos incríveis com roteiros rasos. Mas isso não me afetou, afinal, o que eu curti de fato foram os desenhos, principalmente os do Jim Lee e J. Scott Campbell, pois eram bem diferentes das poucas coisas que já havia visto nas bancas.

Sendo assim, resolvi comprar um exemplar em uma banca de revistas velhas perto da minha casa. Como eu só queria para copiar os desenhos mesmo peguei a edição número #09 do Gen 13, publicada pela editora Globo.

diva0202Eu ficava horas e horas arriscando uns traços (muito mal, diga-se de passagem), até que enjoei daquela revista e fui buscar outros números. Consegui todas as primeiras edições naquela mesma banca, com exceção da revista número #08. Para conseguir essa, fui parar em um sebo na Rua Dagmar da Fonseca, se não me engano, no bairro de Madureira, região norte do Rio de Janeiro. Isso que é vontade de comprar histórias em quadrinhos!

Então, tendo completado minha coleção com o que já havia sido publicado, parei para ler com mais atenção e achei sensacional aquele universo com adolescentes super poderosos e isso foi me despertando uma vontade de ler outras coisas, foi quando lembrei de uma imagem que havia visto da Sara Pezzini na Wizard, numa daquelas listas “As 10 mais” e resolvi buscar as histórias dela. Achei na mesma banca guerreira de revistas velhas os quatro primeiros exemplares daquela minissérie em oito edições da Witchblade.

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Quando comecei a ler Witchblade, passei a me sentir num mundo meio underground. Ninguém do meu convívio lia quadrinhos. Quando eu aparecia com uma revista dessas no colégio, tanto Witchblade quanto Gen 13, a galera pedia pra ver, ficava elogiando meus desenhos (Eu desenhava no quadro negro, nas carteiras e até na parede. Eu era muito revolts! hahahahaha). Teve gente até que me pediu para fazer um desenho da Sarah Granizo, em que ela está quase nua, mas não fiz porque fiquei constrangida em desenhar aquela imagem para terceiros.

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No intuito de continuar minha coleção e conhecer outras HQs, fui a uma banca e de cara já perguntei cheia de orgulho para o jornaleiro onde ficava a área de histórias em quadrinhos. Ele me apontou a Turma da Mônica. Antes de qualquer coisa, quero deixar bem claro aqui que sou apaixonada pela Turma da Mônica, em particular pela Magali, e nunca vi problema algum em comprar e ler na frente de outras pessoas, nem na minha adolescência e nem na vida adulta. A turminha ainda me arranca ótimas gargalhadas, mas naquele momento eu me senti ultrajada.

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O problema não foi o fato da Turma da Mônica ser infantil, mas sim porque eu gostava do status underground que histórias em quadrinhos me davam. Enquanto as minhas amigas colecionavam Querida e Capricho, eu me sentia anos luz na frente com a minha coleção, sem contar a sensação de me rebelar contra aquela sociedade tosca, escrava de futilidades. Só para vocês terem uma noção, aos treze anos eu tinha apelido de “vampira” na escola, isso porque usava batom e esmalte preto, além de um anel em cada um dos dedos da mão (quase todos de caveira). Bem, na época as caveiras, assim como batons e esmaltes pretos, eram consideradas coisas de pessoas endemoniadas e não moda como é atualmente.

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Realmente o fato do jornaleiro olhar pra mim e de cara apontar a Turma da Mônica foi meio que um balde de água fria. Eu fiquei puta com aquilo e na hora nem consegui organizar minhas ideias e dizer o nome da revista que estava procurando. Respondi um NÃO meio seco e disse que queria ver as revistas de super-heróis (os quais nunca fizeram muito a minha cabeça). Aí sim o abençoado me apontou na direção certa.

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Só que essa não foi a única vez, eu passei por essa situação em várias ocasiões. Os jornaleiros sempre me apontavam Turma da Mônica quando tudo que eu queria era a porra da revista do Darkness & Witchblade!

Agora imaginem a surpresa deles quando viam a capa do tipo de revista que eu realmente queria comprar. Isso sim era gratificante!

diva0208Você, leitor, vai dizer que eu não deveria ter ligado tanto assim, afinal, é mais comum ver meninas lendo Mônica e meninos Homem-Aranha, além disso o jornaleiro não tem como adivinhar o que eu quero. Concordo!

Mas veja bem, eu era uma pré-adolescente que não gostava de ser igual aos demais ao meu redor, além de ser revoltada com essa distinção que a sociedade faz entre homens e mulheres, então como não ficar com raiva? Como deixar pra lá? Sério, não tem como. Esse é o tipo de situação que a sua reação só vai mudar conforme você amadurece. Tenho esses valores até hoje, mas por incrível que pareça sou muito mais tranquila.

ISSO É DE MENINA! ISSO É DE MENINO

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Para finalizar, felizmente o tempo passou, eu cresci e já não preciso mais perguntar onde fica a parte de histórias em quadrinhos. E o mais engraçado é que hoje em dia os jornaleiros me olham estranho justamente quando compro alguma revista da Turma da Mônica. Vai entender o porquê!

Nikita

Nikita é como a Bárbara gosta de ser chamada na internet. Leitora de Quadrinhos desde os 14 anos, é apaixonada pelo gênero terror/horror e princesas Disney, em particular a Bela. Nas horas vagas dedica seu tempo a estudar o inexplicável, além de curtir desenhar e ouvir o bom e velho rock n\' roll

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Comentários

comentários


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7 Thoughts on “Divã da Nikita #02 - A difícil arte de ser uma colecionadora de quadrinhos: Parte 1

  1. Quando você ia as bancas, pensou em procurar as revistas ao invés de perguntar por elas? Ou queria mesmo atazanar o jornaleiro?

  2. Boa, Roberto rsrsrs

    Na época em que eu comecei a colecionar, as hq’s não ficavam tanto em evidência como hoje, por isso eu dificilmente enxergava.

  3. Armaged00m|

    Pobres jornaleiros, que provavelmente tiveram mortes horríveis e inexplicáveis depois de contrariar a Nikita… !

  4. muito bacana seu texto! Qdo eu era pirralha (comecei cedo nessa história de gibi) sofria horrores com a solidão de ser a única menina que lia HQ e os meninos achavam estranho. Só na adolescência eu conheci outra leitora e viramos melhores amigas só por causa disso!! (e a amizade quase não começou ela se revelou dcnauta e eu marvete! mas o amor pelo gibi falou mais alto!)E ainda hoje vejo alguns homens e o mais triste, mulheres, torcerem o nariz para nós garotas fãs de gibi. gostei mesmo! Arrasou no relato!

    • Tatilaai, obrigada pelos elogios. Normalmente eu recebo alguma mensagem qnd comentam meus textos, mas o seu não recebi 🙁

      De fato é muito bom conhecer outras meninas que curtem quadrinhos, mas infelizmente eu não tive essa sorte na adolescência… só depois de adulta que fui conhecer outras pessoas com a mesma paixão.

  5. ha!
    Te entendo perfeitamente
    Mas perguntava só qdo não tinha opção…U_U para evitar olhares ¬¬
    rss

    • Hahahahaha eu nunca tive vergonha… acho que não tinha muita noção do quanto o leitor de quadrinhos era mal visto heheheheeh

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